O sujeito andava a toda. Animado, feliz, cheio da grana e satisfeito com a vida, sua única reclamação era não viver para sempre, para poder usufruir ao máximo a vida espetacular que tinha construído.

Quem o olhava de fora sabia, “felicidade daquelas que dura pouco”. Tudo o que é bom, dura pouco. Os parentes, de línguas grandes e dentes venenosos, agouravam, falavam até de risco de morte, pois “felicidade atrai desgraça”. Os amigos, mais amenos e condescendentes, diziam, “felicidade como essa eu não queria, muito grande, vai dar bode”. Uma tia chegou a avisar: “alegria e tristeza correm juntas, a alegria já está aí…”

Mas ele, o feliz, nem se importava, considerava inveja e intriga, “agouro? É só fingir que não é comigo”. Vivia cada segundo de sua felicidade com tanta intensidade que, seus sapatos caros, de tanto sapatear pela rua, desmanchavam-se em questão de dias.

Passados alguns meses, os amigos e parentes preocupados com a duração da felicidade, já alertavam as autoridades, “risco eminente de calamidade pública”. A felicidade já durava tanto e com tanta força, que o medo passou a se disseminar pela cidade. Medo de catástrofes, enchentes, aviões e, até, terremotos. “Vamos todos pagar pela felicidade de um só homem!”.

Mas o feliz nem aí. Vivia sua felicidade sem enjoar, “vai se enjoar de um trem bom desses?”. Andava, pelo contrário, cada vez mais encantado e deslumbrado com sua satisfação, sucesso e animação. Falava, cantava, dançava com tanta agilidade e leveza que era difícil não se contaminar. Excetuando-se o medo de desgraças que essa felicidade gerava, era bom estar próximo dele. Mesmo que ele nem se mexesse.

O medo, como todos sabem, é muito mais contagioso que a felicidade, deve ser um tipo de mecanismo evolutivo, uma gazela corre e as outras correm atrás, disparam. Uma gazela ri, as outras continuam pastando. Deve ter relação com o tempo das cavernas e com medo de leão ou urso. Bom, sei lá. O caso é que o medo se espalha e, a essa altura, a cidade já havia criado uma comissão para estudar o caso da felicidade: “seria ético o sujeito ser tão feliz, e por em rico todos a sua volta?”.

Para a comissão foram designados políticos, engenheiros, médicos, cientistas, religiosos e pessoas de opinião. O próprio feliz foi chamado para depor quando da instauração da CPI na câmara dos vereadores. No dia do seu depoimento a plenária ficou vazia. Só os mais corajosos representantes da política local permaneceram na sala. Havia corrido um boato de que, não havia dia melhor para a cobrança do preço da felicidade que fora usada.

Quando feliz entrou, o silêncio tomou conta, nem um pio. Era como se os pouco falantes que ainda restavam estivessem ocos, como se todas as dúvidas tivessem acabado. Mas só parecia, pois logo o presidente da mesa fez a primeira pergunta…

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